Temas Bíblicos – abr2017
(8) Chave de leitura da Bíblia – Linguagem
Desde o momento em que lemos o Prefácio da Bíblia (Gn 1-11), nos apercebemos que a linguagem da Bíblia é linguagem figurativa. As verdades do nosso Manual catequético são ensinadas através de narrativas, quadros, alegorias e, até, lendas. É quando nos familiarizamos com a sua linguagem, que, então, chegamos a reconhecer o seu valor literário e a forma didática adotada, porque considerada a melhor para transmitir as profundas verdades da nossa fé. A linguagem figurativa da reflexão sapiencial de Israel está alinhada ao primeiro momento da ação pedagógica de Deus, qual foi o de se manifestar pela ação dos seus profetas. Através de narrativas, a partir daquela da criação, vai ilustrando a existência de Deus, os seus atributos, o caminho da realização do homem, a condição de pecado em que este se encontra o plano misericordioso de Deus, etc.
No momento em que formulamos as verdades, que a linguagem figurativa da bíblia nos sugere, explorando a nossa linguagem lógico-dedutiva, descobrimos quanto às duas se integram. Os conceitos se apresentam à nossa mente com a riqueza que a linguagem figurativa soube lhes conferir, enquanto a nossa lógica dedutiva os sintetiza em poderosas intuições. O Deus criador não é mais o simples Princípio não criado, como nós costumamos pensar. Ele é um ser pessoal, perfeitíssimo, porque os seus atributos se apresentam como suas virtualidades de valor infinito. Ele é a Bondade, o Poder, a Beleza e a Sabedoria. Os atributos que a linguagem figurativa sugere, enquanto descreve o Deus de Israel se relacionando com o seu povo, adquirem uma riqueza singular, se os tivermos presentes no momento em que os pronunciamos na nossa linguagem: misericordioso, paciente, benigno, longânime. Dessa forma, alcançamos uma compreensão d’Aquele que, por ser impossível de ser alcançado, exatamente por isso se apresenta transcendente, enquanto compreendemos que, por ser perfeitíssimo é um Ser de virtualidades infinitas.
A simbiose entre linguagem figurativa e linguagem lógico-dedutiva, deve ser por nós utilizada, também, quando lemos os textos da Igreja apostólica. Os evangelistas, os apóstolos que escrevem as suas cartas, os doutores que nos apresentam os seus escritos, quais Apocalipse, Carta aos Efésios, Carta aos Hebreus, estão nos brindando com textos escritos segundo a linguagem figurativas da reflexão sapiencial, própria da tradição do povo judaico. Deles haurimos toda a sua doutrina quando captamos os gêneros literários que eles utilizam: genealogias, quadros alusivos, narrativas midrashicas; quando nos apresentam Jesus falando em parábolas. Aliás, é exatamente a parábola que nos esclarece acerca da importância de agregarmos a linguagem figurativa à linguagem lógico-dedutiva, lembrando o que o evangelista anota: Jesus falava em parábolas para associar (gr.: pará-ballo) a doutrina que queria ensinar a um quadro da vida cotidiana.
Quando nos tornamos capazes desta associação, chegamos a usufruir daquela riqueza imensa que Jesus oferece na condição de “Unigênito Deus” (Jo 1,18), de “Palavra que se fez carne e colocou a sua tenda entre nós” (v.14). É ele, nos diz São João, que de Deus “nos deu a explicação” (v.18). Trata-se de algo exprimido à altura da capacidade humana de compreender que, todavia, tem como fonte Jesus, Sabedoria, e, como conteúdo, uma doutrina precisa.
Pe. Fernando Capra