Temas Bíblicos – 1Jo (16) Reflexão final
Quando chegamos ao fim da Primeira Carta de São João, cuja leitura nos é oferecida, cada ano, pela Liturgia diária do Tempo do Natal, notamos que o autor utiliza uma linguagem diversificada em cada tema que ele aborda e que alcançamos a noção exata de cada termo somente quando dominamos as suas formas diversificadas.
Consequentemente, devemos dizer que para ler 1Jo devemos construir um vocabulário que somente é possível dominar na medida em que progredimos na sua leitura. Se, porém, podemos nos valer de um desbravador que já foi na nossa frente e abriu o caminho… Tudo será mais fácil.
Ao abordar 1Jo nos espera um trabalho minucioso de polimento de conceitos. Eles estão na mente do autor e inspiram as suas argumentações. Quanto mais deles descobrirmos o brilho, tanto mais nos aproximaremos das emoções e consolações que ele experimentou: “E isto vos escrevemos para que a nossa alegria seja completa” (1,4).
A princípio, dizemos que João escreveu esta Carta para precaver os fiéis das igrejas do perigo de serem desencaminhados pela pregação dos que, embora tivessem começado na condição de “uns dos nossos”, revelaram não o ser. Tornaram-se os que negam ser Jesus o Cristo. Aos quais, João enfaticamente responde: “Nós somos de Deus, quem conhece a Deus nos ouve” (4,6). Encontramos a explicitação dessa convicção resumida em 5,13: “Eu vos escrevo tudo isto a vós que credes no nome do Filho de Deus, para saberdes que tendes a Vida eterna”. Estas são palavras que encontramos no fim da argumentação que começa em 5,5. A argumentação (5,5-13) é um apêndice do tema anunciado em 2,18-28, retomado em 4,1-6. Notamos, todavia, que ela prepara o epílogo, que é uma afirmação peremptória da condição divina de Jesus Cristo, propositalmente lembrado com o termo do prólogo, enquanto era apresentado por João na condição d´Aquele que era desde o princípio (1,1; 2,13): “Palavra da Vida, Vida, Vida eterna” (1,1-2).
Quando, porém, comparamos esta Carta com o Apocalipse de João, notamos que João não se limita a um tema específico. Sempre lembra que a solução do problema tem seu fundamento na vivência plena da vida cristã. Somente o fiel que chega a ter em si a vida de Deus pelo exercício da caridade perfeita é capaz de se precaver seja do erro da apostasia, como do desânimo diante das provações que o testemunho da Palavra e de Jesus Cristo acarreta.
Por causa disso, a Carta se torna um manual de vida cristã. Por ela, João quer nos transmitir “a mensagem que ouvimos de Jesus Cristo, o Filho” (1,5).
Para entender a mensagem de Jesus em toda a sua importância, João nos diz que a considera algo que procede da Luz. Trata-se de algo incompatível com a treva. Inspira-se em Gn 1, 3-5. Temos o seu comentário em Jo 1,9-10. A vida cristã é a vida dos que são estirpe de Deus, porque gerados por Deus. Uma vida que se opõe, diametralmente, à condição daqueles que, seduzidos pelas concupiscências ou desencaminhados pelos vãos arrazoados dos que vão além daquilo que os Apóstolos ensinaram, abandonam a fé que abraçaram desde o princípio.
Quem dá a sua adesão de fé a Jesus Cristo é justificado, reconciliado com Deus, mediante a adoção filial “em Jesus Cristo” (Ef 1,5). A sua condição embrional, embora seja vida plena, qual Jesus mereceu para a sua humanidade pela ressurreição, acarreta o necessário exercício de uma continuada resistência ao Mal, porque, como nos diz Pedro: “O Diabo vive nos espreitando para nos devorar”. Nós podemos não ter pecados, mas não estamos isentos de recaídas. Quem não vive a purificação e parte para abraçar o pecado deixa de ser de Deus. Ele se torna do Diabo.