Fé e Política – nov2016
“As maçãs envenenadas”
Recentemente, ao ministrar uma palestra sobre a dignidade da pessoa humana para um encontro de casais em uma paróquia no nosso Vicariato, fui perguntando por um senhor muito simpático e extremamente gentil sobre uma expressão que mencionei no transcorrer da mesma. Disse, naquela ocasião ao refletir sobre a necessidade de revermos a escravidão a que nos submetemos quando nos rendemos aos caprichos do consumismo, que precisávamos tomar cuidado com as “maçãs envenenadas”.
Essa expressão, constantemente utilizada pelo Professor Roberto Shinyashiki em seu excelente livro “Heróis de Verdade”, chama a atenção para as armadilhas a que somos constantemente submetidos em nossa sociedade. Essas armadilhas são, na verdade, situações com que nos deparamos no quotidiano onde, infelizmente, as aparências e as necessidades de ser o que não somos ditam as regras e comandam a nossa vida. Isso acontece sempre que fazemos alguma coisa simplesmente para atender a um capricho de outra pessoa e não as nossas verdadeiras necessidades. Um bom exemplo é quando escolhemos uma profissão ou compramos algum bem simplesmente para atender a um desejo de um pai, um amigo, marido ou namorada. Ou ainda, para piorar um pouco mais, para atender a uma demanda ditada pela própria sociedade. Sempre que fazemos isso estamos, de uma forma ou de outra, mordendo uma “maçã envenenada”.
Como na história da literatura infantil, essa maçã é extremamente bonita e vistosa: bem vermelha por fora, com uma aparência agradabilíssima e apetitosa, mas com o veneno letal por dentro que destrói vagarosamente os verdadeiros valores que estão na essência de nossa alma, transformando, lentamente, os nossos relacionamentos humanos em coisas superficiais e falsas. É como se nós precisássemos ser o que não somos para atender a um determinado padrão ditado por alguém ou por algum grupo. Isso ocorre, por exemplo, quando alguém chega para nós e diz:
– Mas “Fulano”, como pode você, uma pessoa tão “requintada” e de “bom gosto”, utilizar um celular tão velho e fora de moda? O que vão pensar de você? Isso não pega bem…
Se cairmos na tentação do consumo em função desse tipo de armadilha, morderemos uma maçã envenenada. E essas armadilhas são construídas em cima das cascas ou, com se diz na psicologia, em cima dos nossos egos. São eles que se preocupam apenas com as aparências e nos afastam do essencial que é invisível aos olhos. Precisamos tomar muito cuidado e aprofundar mais os nossos relacionamentos. Estabelecê-los não pelas camadas das aparências, mas pelo que temos de mais profundo, mais bonito e o que verdadeiramente somos: a nossa essência.
Sei que muitos podem estar se perguntando o motivo pelo qual eu abordei esse assunto em um espaço sobre Fé e Política onde, conforme já fizemos diversas vezes, deveríamos refletir e falar sobre os mandatários e os seus respectivos papéis no exercício de seus mandatos. Entretanto, eu acredito que essa questão ligada à escala de valores em nossa sociedade e a forma como estabelecemos as relações com as pessoas baseada, infelizmente, na supervalorização do “Ter” em detrimento do “Ser” é uma das origens de boa parte dos grandes problemas que temos hoje, como a violência, os critérios de escolhas em nosso voto, o desemprego, a fome e etc. Precisamos, urgentemente, rever os nossos critérios e os valores, principalmente os que passamos, cotidianamente, para os nossos filhos, e estabelecer relações pelo nosso interior e não pelas “aparências”. Somente assim é que poderemos construir uma sociedade mais justa, mais solidária e menos desigual.
(*) Robson Leite é professor, escritor, membro da nossa paróquia, Ex-Superintendente Regional do Ministério do Trabalho e Emprego no RJ e foi Deputado Estadual de 2011 a Janeiro de 2014.
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