Fé e Política – Mar2019
“Fraternidade e políticas públicas: o que eu tenho a ver com isso?”
Nos últimos dois meses, eu tenho realizado uma série de palestras e formações, como faço todos os anos, sobre a campanha da fraternidade. A desse ano, em especial, possui uma característica que se aproxima bastante da minha área de pesquisa acadêmica: políticas públicas. Porém, não se pode fazer nenhuma reflexão sobre a campanha da fraternidade sem que antes se aborde o importante histórico das campanhas e os reais motivos que levaram a Igreja Católica no Brasil a se debruçar sobre os temas sociais e políticos no período da quaresma.
O período quaresmal, que nos leva à penitência em preparação para a Páscoa do Senhor, é tempo de reflexão e conversão. Tempo de mudança. E é exatamente nesse momento que a Igreja no Brasil, desde o encerramento do Concílio Vaticano II, promove a reflexão de temas de cunho social e político. Entretanto, com a profunda mudança que o Vaticano II propôs à Igreja, a CNBB, à luz das constituições apostólicas do concílio, debruçou-se primeiramente em algumas questões internas ligadas à sua renovação. Isso fica claramente demonstrado nas campanhas que vão de 1964 a 1972. Temas como: “Igreja em renovação”, “Paróquia em Renovação”, “Participação” e “Serviço e Vocação” sinalizam o início de um novo tempo. Um tempo onde a participação do leigo dentro da Igreja passa a ser muito mais ativa do que tinha sido até então.
Após esse período, a CNBB passa, a partir de 1972 e seguindo a mesma orientação conciliar e evangélica do ciclo anterior, a se concentrar nas graves questões sociais que afetam até hoje o nosso país: moradia, saúde, educação, meio ambiente, juventude, exclusão, pobreza, reforma agrária, segurança pública e a política propriamente dita foram, por mais de uma vez, temas das campanhas da fraternidade. E alguns frutos estão aí até hoje. O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente –, foi fruto de uma grande mobilização iniciada com uma campanha da fraternidade. Há diversos outros exemplos que demonstram a importância e a efetividade desse valoroso trabalho da CNBB em nosso país.
O Evangelho é muito claro e contundente sobre a urgente necessidade da participação do leigo na política, para atuar na transformação da sociedade rumo a civilização do amor. Em Mateus, 25, 31-46, Jesus deixa muito clara a opção preferencial pelos pobres e marginalizados. “Quem fizer ao mais pequenino desses irmãos, foi a mim que o fizeste”. E é nessa perspectiva que a Igreja do Brasil nos lembra que é incoerente ser cristão e se omitir frente as realidades perversas e socialmente injustas que estão ao nosso redor. Além do mais, é sempre bom lembrar que o posicionamento e as ações de Jesus e seus discípulos tinham uma clara opção: os excluídos. E isso o levou à morte de cruz, pois essa posição incomodava profundamente o poder político de sua época – que condenou, torturou e matou injustamente Jesus Cristo.
A campanha desse ano não é diferente. Ela apresenta a necessidade de se colocar as políticas públicas à serviço da construção do Reino. E para isso, a participação efetiva da Igreja – povo de Deus – é indispensável. Há instrumentos para isso, como os conselhos garantidores de direitos, os conselhos de representação, os sindicatos, as associações de moradores e a própria política partidária. Todos eles são meios importantes que precisam ser utilizados pelos leigos nesse sentido.
Sabemos que a intolerância, fomentada na incapacidade de ouvir o diferente, tem, lamentavelmente, influenciado demais as pessoas em nosso país, sobretudo na política. E isso, infelizmente, só atrapalha. O respeito ao diferente e a capacidade de ouvir mais do que falar são elementos fundamentais para a democracia. Política não é futebol, por isso jamais deve haver a figura “pejorativa” dos “vitoriosos e derrotados”. Claro que governo e oposição são indispensáveis no processo democrático, mas a campanha da fraternidade desse ano cria uma ótima oportunidade de se refletir sobre projetos e propostas políticas ao invés de se debater sobre nomes e partidos – o que deve ser feito também, mas na eleição.
Esse é o caminho. Aproveitar a campanha da fraternidade desse ano e recordar o que nos sugeriu o Papa Francisco em 2013 aqui no Brasil acerca de como resolver os nossos problemas políticos para, dessa forma, juntos construirmos a civilização do amor: “Diálogo, diálogo, diálogo”.
(*) Robson Leite é professor, escritor, membro da nossa paróquia, Ex-Superintendente Regional do Ministério do Trabalho e Emprego no RJ e foi Deputado Estadual de 2011 a Janeiro de 2014.
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