Fé e Política – Jan2019
“Amor e política”
Existe uma passagem no Evangelho que, ao longo de muitos anos, muito me incomodou: aquela em que Jesus nos diz categoricamente para amarmos os nossos inimigos. Orar pelos que nos perseguem (Lc 6, 27). Entretanto, ao ler essa passagem, alguns questionamentos sempre surgiam: como amar um político corrupto que vota e atua sempre contra os interesses da população? Ou então, como amar aquele colega de trabalho que passa por cima de qualquer ser-humano para conseguir uma promoção ou um aumento? Como controlar um sentimento de ódio ou raiva que, eventualmente, possamos ter contra alguém que venha a agir de forma leviana ou injusta no nosso dia-a-dia? Confesso que durante um bom tempo essa passagem mexeu muito comigo. Porém, um belo dia em minha época de universidade durante uma conversa com um grande professor que tive, ele me deu uma explicação que marcou para sempre a minha vida e que faço questão de trazer aqui para a nossa reflexão.
A nossa sociedade nos ensinou que o amor é somente sentimento e, desta forma, ele é o “pré-requisito” para qualquer gesto de carinho e solidariedade que possamos fazer. Isso em qualquer tipo de relacionamento: seja no namoro, no casamento, com amigos, vizinhos ou colegas de trabalho. Porém, se formos analisar friamente a definição do amor existente na Carta de São Paulo aos Coríntios, capítulo 13, observaremos que todos os adjetivos que qualificam esse “amor” são muito mais ligados a atitudes do que a sentimentos. Vejamos: “… O amor é paciente, é prestativo, não é invejoso, não se ostenta e nem se enche de orgulho”. Todas essas definições dadas ao “amor” na epístola de São Paulo estão muito mais ligadas a atitudes do que a sentimentos. Inclusive, em algumas edições da bíblia perceberemos que a tradução para o português coloca a palavra “caridade” no lugar do “amor”. Neste caso, fica até mais fácil entender que a epístola não fala de sentimentos, mas de atitudes. A própria palavra “amor” utilizada no Evangelho de São Lucas pode ser perfeitamente traduzida da palavra grega “agapé” que, ao pé da letra, quer dizer “amor atitude ou amor incondicional”. Sei que soa esquisito aos nossos ouvidos falar de “amor-atitude”, pois, conforme falamos acima, nós aprendemos na nossa sociedade que o amor é sentimento e não atitude. Mas é exatamente neste contexto que se enquadra o ensinamento de Jesus: precisamos ter a atitude de amor independente do sentimento. Amar ao pai, à mãe, à irmã ou ao filho é fácil. Difícil e desafiador é amar quem está distante de nós e que não conhecemos. Ou, ainda pior aos olhos humanos, amar ao inimigo. Obviamente que pode até acontecer de brotar um sentimento de ódio ou rancor em nossos corações, entretanto reagir impulsionado por esse sentimento e ter uma atitude agressiva será sempre uma escolha que faremos. O convite do Cristo, presente nas passagens citadas acima, é exatamente esse: romper com a ideia do sentimento que motiva a atitude. A proposta é inverter essa lógica: a atitude é que precisa construir o sentimento. Experimente isso com aquele “vizinho chato” ou com o “colega insuportável” do trabalho e dê um bom dia caprichado e recheado de sorriso para eles. Construa o sentimento de amor através da atitude. Com paciência e insistência você perceberá que eles não são tão chatos quanto pareciam ser. Esse é o grande convite que Jesus nos faz neste Evangelho.
Sei que muitos devem estar se perguntando por que abordei esse assunto em uma coluna que se propõe a falar de “Fé e Política”. É uma boa pergunta, entretanto, conforme venho falando há 15 anos aqui neste espaço, a Política é uma das mais belas formas de manifestar o amor ao próximo, principalmente quando esse amor é incondicional, ou seja, voltado única e exclusivamente para proporcionar o Bem Comum para todos, e não para os nossos parentes e amigos, conforme infelizmente vemos quando alguns políticos nomeiam parentes em seus gabinetes e quando alguns eleitores trocam votos por favores.
Esse é o convite. Vamos trabalhar juntos, incansavelmente, para que, através da política, possamos construir o Reino do Pai em nossa sociedade, conforme pedimos quase que diariamente na oração do Pai Nosso ao dizer: “venha a nós o vosso Reino”!
(*) Robson Leite é professor, escritor, membro da nossa paróquia, Ex-Superintendente Regional do Ministério do Trabalho e Emprego no RJ e foi Deputado Estadual de 2011 a Janeiro de 2014.