Fé e Política – dez2017
“A corrupção”
*Robson Leite
“Os fiéis viviam todos unidos e tinham tudo em comum.
Vendiam suas propriedades e seus bens, repartindo tudo entre todos,
conforme a necessidade de cada um.” (At 2, 44-45)
Há cerca de um mês eu recebi uma mensagem eletrônica de um leitor fazendo referência a um antigo texto meu publicado aqui neste espaço onde eu abordava a crise ética existente na política brasileira. Dizia-se muito entristecido ao ser obrigado a concordar comigo, uma vez que ele também enxergava um cenário de total falta de compromisso dos políticos com a “rés pública” e uma clara preocupação destes com os seus interesses privados e particulares. Disse mais, afirmou que sempre se preocupou em escolher com bastante carinho os seus representantes, entretanto, hoje ele se sente frustrado, cansado e desiludido com a corrupção endêmica e generalizada no trato da coisa pública, conforme é noticiada quase que diariamente pelos meios de comunicação. Ao final de sua mensagem ele faz uma pergunta crucial: o que fazer? Votar nulo seria a solução e a resposta para essas crises?
Gostei muito da mensagem respeitosa e carinhosa deste nosso amigo, entretanto, antes de responder a sua pergunta existem alguns aspectos que vão além do papel do mandatário e que eu gostaria de abordar aqui na nossa coluna deste mês.
Em primeiro lugar eu acredito que boa parte da atual crise política seja mera consequência de uma enorme crise ética em que a nossa sociedade está mergulhada. Chamo a atenção para uma novela brasileira que foi exibida em uma importante emissora de televisão onde, para surpresa do próprio autor desta, boa parte dos telespectadores pediam, através de pesquisas, cartas e mensagens, para que o “bandido da trama” levasse vantagem ao final da história. Inclusive, conforme o referido autor citou em uma entrevista concedida recentemente, os argumentos eram os mais egoístas e absurdos possíveis. Coisas como “Qual o problema? Se eu tivesse oportunidade também agiria daquela forma” foram bastante citados e quase unânimes entre os defensores do “bandido”.
Confesso que mesmo não tendo visto a tal novela eu não fiquei surpreso ao ler essa entrevista. Até porque já venho há algum tempo ouvindo muita gente defender esse tipo de conduta. Basta conversarmos a respeito disso com os colegas de trabalho, de faculdade ou até mesmo de condomínio. Quantos de nós já não ouvimos ditados e frases de efeito para justificar atitudes nada éticas como sonegar um tributo ali, fazer uma “bandalha” aqui ou até mesmo, aproveitando as eleições que se aproximam, trocar o voto por um favorzinho pessoal acolá? Infelizmente essas práticas já previstas pelo Barão do Itararé ao pronunciar a célebre frase “a corrupção é o bom negócio para o qual eu não fui convidado” são constantes e cada vez mais frequentes.
Ao analisarmos as questões acima à luz do próprio Evangelho, como, por exemplo, quando Jesus nos diz que “Quem é infiel nas pequenas coisas também será nas grandes” (Lc 16, 10-12), perceberemos a dimensão da nossa responsabilidade através da nossa atitude. Cabe ressaltar aqui a nossa grande responsabilidade na educação dos nossos filhos. Será que temos tido boas atitudes na frente de nossas crianças ou nos comportamos como aquele pai que diz para o filho não fumar por que faz mal para saúde com um cigarro entre os dedos?
Em segundo lugar, porém não menos importante, está na resposta para a pergunta do nosso amigo acerca do voto nulo como solução dos nossos problemas. É preciso deixar claro que a eleição não será anulada caso mais de 50% dos eleitores anulem seus votos. Isso é uma interpretação errada da lei eleitoral. Votar nulo só beneficiará aos próprios candidatos, uma vez que estes precisarão de menos votos para conseguir um mandato graças ao cálculo do coeficiente eleitoral.
Antes de concluir eu gostaria de deixar claro que não estou defendendo os políticos. A questão é que já abordamos por diversas vezes o papel deles aqui nesta coluna. Entretanto, cabe a nós identificarmos o joio e separamos este do trigo. E essa tarefa, aparentemente difícil, somente será facilitada quando nós, eleitores e membros de uma sociedade egoísta e individualista, buscarmos a nossa participação altruísta e sem interesses privados nas pastorais sociais, nos grupos de fé e política, nas associações de moradores e, principalmente, no acompanhamento dos mandatos. Como eu sempre digo em palestras e cursos, não existe resposta certa na urna. O que existe é a necessidade de acompanharmos de perto os mandatos que demos aos nossos eleitos. Além disso, faz-se urgente a necessidade de revermos também as nossas atitudes do dia a dia. Pensar no coletivo e na primazia do bem-comum não pode jamais ser exclusividade da classe política. Tem que ser responsabilidade nossa, seja em casa, no trabalho, na faculdade ou em qualquer lugar.
Somente assim, pensando sempre no próximo é que nos aproximaremos das primeiras comunidades Cristãs conforme citado na passagem dos Atos dos Apóstolos que ilustra este artigo.
(*) Robson Leite é professor, escritor, membro da nossa paróquia, Ex-Superintendente Regional do Ministério do Trabalho e Emprego no RJ e foi Deputado Estadual de 2011 a Janeiro de 2014.
Site: www.robsonleite.com.br
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