Espaço Teológico – Administradores, não donos!
Michele Amaral
Bacharel em Teologia – PUC-Rio
Estamos nos aproximando da Páscoa e com isso iremos nesse mês iniciar a quaresma, tempo de preparação para essa grande festa. Como todo ano na quarta-feira de cinzas a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) nos convida a refletir sobre um assunto de relevância na vida cristã.
O grande diferencial é que este ano iremos refletir com as Igrejas do CONIC (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil), ou seja, a Campanha da Fraternidade será IV Campanha Ecumênica. Ela terá como tema “Casa Comum, nossa responsabilidade”, onde deveremos refletir sobre o cuidado com a criação e a luta pela justiça. Tema esse que nos faz lembrar da Carta Encíclica Laudato Si’ (já conversamos sobre ela no mês de julho de 2015) que nos fez repensar sobre a forma como o ser humano está tratando o planeta.
Diante disso os chamo a refletir sobre o texto da criação no Gênesis, sim Gênesis, pois olhar para trás é também um olhar para frente. Ao lermos o Gn 1 vemos Deus criando o Homem e a Mulher a sua imagem e semelhança, ou seja, no amor e para o amor, pois Deus é amor e será representado nos seus filhos e nas suas criaturas quando elas se tornarem construtoras do amor. Fazemos parte da criação total de Deus e não temos direto absoluto de posse sobre o restante da mesma.
Ao ser humano, Deus confiou e colocou ao seu dispor a criação (Gn 1,28), é chamado a dominar, mas temos que ter bem claro que esse domínio não pode ser entendido como exploração e sim como administração responsável. Deus possui a terra e confiou-a a humanidade, para que cuidemos dela. A soberania que o autor bíblico quer salientar tem como objetivo o gerenciamento e a consciência racional de um plano maior, mas não significa que tenhamos autoridade para matar e destruir. O homem recebeu, como missão, esta tarefa de cultivar a terra e produzir seu alimento (Gn 2,15). Ele cultivava o jardim, mas tinha a consciência de que era inquilino, um arrendatário, e o proprietário era Deus. Se o jardim, se tudo criado é propriedade de Deus, o ser humano é um hóspede e na qualidade de hospede tem a missão de gerenciar, de cuidar, mas não lhe cabe o direito de proprietário.
Tudo criado pertence a Deus, e administrar, desfrutar é diferente de destruir ou de apropriar-se. Toda a terra é de Deus, ao homem cabe o direito de tirar dela o seu sustento, mas não lhe cabe o direito de posse ou a prepotência para impedir que todos habitem. O jardim e as árvores estão disposição de todos os habitantes, por direito natural, e o acesso a ela e o uso dos seus recursos devem ser partilhados e devem estar disponíveis a todos.
Depois dessa leitura devemos nos perguntar: se o começo era harmônico, pacífico e Deus estava caminhado com o ser humano no jardim, como terá que ser para que Deus volte a caminhar nesse jardim destruído? O que devemos fazer para restaurar esse jardim?
Caso queiram dar sugestões para algum artigo dessa coluna, entre em contato: misouzaamaral@gmail.com