Carnaval
O país que tem uma das maiores populações religiosas do mundo, também é apontado por ter o mais famoso carnaval do mundo. Parece ambíguo, mas será? A questão é saber o que fazer no carnaval. Muitos cansam de dizer que é a festa da ‘carne’, uma profanação e tudo isso que você leitor já ouviu, ou mesmo disse.
Segundo o filosofo Bakhtin, o carnaval nos países europeus tinha um viés político, que se baseava na inversão da ordem social, já que a sociedade da época era rígida e sem mobilidade. Desse modo, no carnaval havia essa possibilidade de inversão para quem se interessasse. Então, o bobo poderia se fantasiar de rei, a corte se tornava secular, assim como homens se vestiam de mulheres e mulheres de homens, até os mais castos tentavam se tornar mais luxuriosos. O objetivo era questionar o poder como uma válvula de escape para sociedade. Os dias de carnaval eram dias em que a ordem oficial das coisas, bem como a noção de pecado estava suspensa.
Só que de lá para cá, passaram-se séculos e séculos e a sociedade já não é tão enrijecida como à época e as pessoas possuem liberdade para se expressar melhor. No entanto ainda há muita gente que se apega ao carnaval como uma forma de perder a ordem e o bom senso para fazer o que, no íntimo, possui vontade. É aí que está o X da questão!
O carnaval hoje é uma festa de integração de inúmeras culturas e mesmo de pessoas. A alegria move muita gente, e a paquera acaba fazendo parte da festa, o que é até bem natural, se considerarmos um público jovem e solteiro. No entanto, é fundamental defender que não é uma festa proibida, mas como qualquer outra é importante saber se definir enquanto cristão, para viver e fazer o que é adequado. Afinal tudo é permitido, mas nem tudo é conveniente, já dizia o apóstolo Paulo.
Além disso, o samba por ser culturalmente brasileiro tem seus impactos na sociedade e atrai as multidões. Anos atrás, os sambas-enredo eram mais conhecidos e estavam no dia a dia das pessoas, eram aqueles sambas marcantes. Isso ainda não mudou, os sambas continuam fortes, mas o acesso está um pouco mais escondido dos meios tradicionais de comunicação. Mesmo assim, muitos carnavais marcaram a vida de inúmeras pessoas de nossa comunidade e, destas, várias ainda atuam na folia.
Já é comum encontrar todos os anos pessoas da nossa paróquia nos blocos, ou mesmo fantasiadas na concentração do Sambódromo. Se formos pegar todos os que já participaram, poderíamos montar uma escola de samba do Loreto, com baiana e tudo. Dona Rosa Gui, é membro do Fé & Dons e também já foi do Império Serrano por quase 30 anos. Desde 1999 ela é baiana da Mangueira e, para o carnaval de 2017 ela foi promovida para apoio da ala das baianas. Rosa diz que optou por ser católica já adulta quando quis ser batizada, e diz que nesses anos em que vive no carnaval só viveu bons momentos “Ali, até hoje só encontrei coisa boa, cada um com seu credo, mas o que mais prevalece é o respeito, ninguém nunca me chamou para frequentar nada, porque sabem que eu sou católica. Eu amo carnaval e participo para me divertir, dançar e dar alegria para as pessoas que estão na avenida prestigiando esse espetáculo cultural que é o carnaval. Gente ruim tem em todo lugar, mas a gente tem que saber se portar de acordo com a nossa conduta ética. Muitas pessoas pecam pelo excesso, tudo em excesso é ruim”, declarou.
O Joel e a Sonia são do ECC, do Curso de Noivos e, também, portelenses e passam pela avenida há cerca de 25 anos. Hoje eles fazem parte da velha guarda da União Parque Curicica. Eles contaram que toda a família desfila e em 2013 montaram uma ala de paroquianos na Renascer de Jacarepaguá, quando a escola estava no grupo especial. A Sonia se vê como uma evangelizadora na avenida. Ela conta que todos os meses, uma velha guarda de alguma escola faz aniversário e nesse evento às 18h todos param, rezam um pai nosso e, na sequência, a voz de Roberto Carlos cantando Ave Maria toma conta dos membros da ala. “A gente tem que estar lá para representar o nosso credo e nossa devoção”, disse.
O Fé e Dons, também esteve presente nesse desfile de 2013. O Dennys, apesar de ser torcedor da Beija-Flor, só desfilou uma vez e foi pela Renascer. Ele acredita que não há problema, desde que não se esqueçam das obrigações e de viver na quaresma um tempo de contrição “muitas coisas se destorceram do objetivo de celebração do carnaval, mas se você não faz algo que não faça mal a você ou a algum irmão, não é isso que vai te tirar a salvação.”, afirmou.
Aproveitar a festa e toda a diversão e alegria que ela proporciona é um grande passo para reafirmação da fé e dos valores que cada um carrega dentro de si, sobretudo exercitar a tolerância que, ainda hoje, está em falta.
Phillipe Rabelo
Pascom